Artigos 25.03.20

Coronavírus e os efeitos no contrato de emprego

Por Renata de Oliveira Pinho Nagel, advogada, associada do escritório […]

Por Renata de Oliveira Pinho Nagel, advogada, associada do escritório Sotto Maior & Nagel Advogados Associados *

Em que pese a divergência de opiniões quanto a real gravidade do novo Coronavírus (COVID-19), certo é que muitos governos do mundo determinaram a quarentena como medida imediata, com o objetivo de frear o avanço da contaminação de tal vírus. Em razão dessa medida extrema, empresas de grande, médio e pequeno portes, dos mais variados segmentos da economia, foram obrigadas a paralisar abruptamente ou, ao menos, diminuir consideravelmente a sua produção e/ou a prestação de serviços.

Apesar de muitas funções poderem ser prestadas por meio de home office, a quarentena está provocando a diminuição e/ou inexistência de demanda para diversos segmentos do mercado. O resultado é a diminuição da arrecadação e, por via de consequência, a impossibilidade/desnecessidade de manutenção de um quadro de funcionários ativo.

Em razão de tal cenário, surgem questionamentos sobre as atitudes que podem ser tomadas por empresários eventualmente afetados pela atual crise. Passamos à análise de algumas hipóteses.

Como primeira opção está o afastamento dos empregados dos locais físicos do estabelecimento empresarial, dando margem à prestação de serviços por home office, modalidade essa muito referendada com o avanço da tecnologia e dos sistemas de informação (art. 75-B da CLT). Segundo o texto consolidado, após a Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/17), tal modalidade contratual deve ser acordada pelas partes e registrada em aditivo contratual, dele devendo constar eventual responsabilidade por eventuais despesas geradas, se do empregado ou do empregador.

Como segunda opção, tem-se a utilização de banco de horas. De forma simples, as horas não trabalhadas durante um dia podem ser exigidas posteriormente (e vice-versa). Essas horas faltantes para se completar as 220 horas mensais (no caso de empregado contratado para jornada de 8 horas) podem ser exigidas quando do retorno das atividades empresariais. Para tanto, deverá ser observado o limite de duas horas extras por dia e que as horas faltantes poderão ser compensadas dentro do semestre (quando o banco de horas for acordado individualmente) ou dentro de um ano (quando acordado mediante negociação coletiva) (art. 59, §2º, §3º, §5º; art. 61, §3º da CLT).

Como terceira opção, tem-se a utilização do chamado lay-off, pelo qual se autoriza a suspensão dos contratos de trabalho, por tempo certo e determinado, com a finalidade de adequar a produção à demanda do mercado, bem como favorecer a recuperação econômico- financeira das empresas (art. 1º da L. 13.189/15).

No ordenamento juslaboral brasileiro, o layoff pode ocorrer tanto por meio da suspensão do contrato de emprego para a qualificação profissional (art. 476-A da CLT) ou mediante a redução temporária da jornada de trabalho e da remuneração pela adesão ao Programa Seguro-Emprego (L. 13.189/15). Em ambas, exige-se a participação do sindicato profissional (art. 8º, VI da CRFB/88).

Pontua-se, outrossim, que o Governo Federal editou a MP 927/20 no dia 22 de março de 2020, muito criticada pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça (Anamatra) e pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a qual permitia a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sem a necessidade de intermediação do sindicato profissional. Trata-se, pois, de outra modalidade de layoff, na qual o empregador, mediante anuência do empregado, desonera-se de pagar o salário e, em contrapartida, facultou-se o pagamento de uma ajuda compensatória em valor a ser definido conjuntamente e a oferecer cursos on-line durante o período. Essa modalidade, porém, foi rapidamente revogada do texto provisório pela Medida Provisória 928, publicada no dia 23 de março de 2020. Outras medidas autorizadas pela MP 927/20 e que, ainda estão em vigor, seriam a concessão de férias coletivas e a antecipação de férias individuais e de feriados.  

Outra opção, mais abrupta ao emprego, é a rescisão do contrato de trabalho em razão de força maior, provocada por ato de governo. Nessa possibilidade, o empregador deve arcar com as verbas rescisórias típicas da dispensa sem justa causa, com exceção exclusivamente da multa de 40% dos depósitos de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). A referida verba indenizatória fica a cargo do governo que praticou o ato que culminou na paralisação das atividades. Essa verba fundiária-indenizatória deverá ser exigida diretamente à Fazenda Pública e, em eventual ação judicial, a competência para julgamento será da Vara da Fazenda Pública, na qual o empregador participará como terceiro interveniente (art. 486 e art. 501 da CLT).

Vislumbra-se, ainda, a possibilidade de distrato contratual, figura essa na qual ambas as partes (empregado e empregador), amigavelmente, resolvem o contrato de trabalho, sem a necessidade de intervenção sindical (art. 477-A da CLT). Segundo a norma consolidada, texto após as alterações da Lei n. 13.467/17, nesta modalidade de resolução contratual, o empregador pagará as verbas rescisórias na sua quase totalidade, com exceção das verbas relativas ao aviso-prévio indenizado e multa do FGTS, que serão devidas pela metade (art. 484-A da CLT). Entretanto, pontua-se que, para que a dispensa gere quitação plena e irrevogável dos direitos trabalhistas, é necessário a participação prévia do sindicato profissional (art. 477-B da CLT). 

Esclareça-se, ademais, que, após a Reforma Trabalhista, é possível a demissão em massa de empregados, independentemente de participação do sindicato da categoria profissional na negociação. Assim, caso a empresa opte pela dispensa coletiva de empregados, é possível que tal seja feita mediante acordo individual com o respectivo empregado, sem qualquer prévia anuência do sindicato (art. 477-A da CLT).

* Renata de Oliveira Pinho Nagel é advogada, graduada em Direito pela Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), em 2013. Formou-se também em Administração de Empresas pela Escola Superior de Administração e Gerência da Universidade do Estado de Santa Catarina (ESAG/UDESC), em 2015. Em 2016, concluiu Pós-Graduação em Direito Material e Processual do Trabalho pela Faculdade CESUSC – Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina.

Assine e receba nossas notícias

    Ao assinar você concorda automaticamente com nossa política de privacidade - clique aqui e saiba mais