Artigos 04.06.25

Responsabilidade Jurídica e Estratégias de Conformidade na Atuação de Influenciadores Digitais 

1. Introdução  A atividade de influência digital, embora carente de […]

1. Introdução 

A atividade de influência digital, embora carente de tipificação normativa autônoma, opera em regime de responsabilidade jurídica crescente, com implicações diretas sobre a integridade patrimonial, reputacional e contratual de seus agentes. O avanço do marketing de influência como vetor predominante de consumo tem gerado repercussões normativas e jurisprudenciais ainda em consolidação, mas já suficientemente densas para justificar sua sistematização crítica. 

Este trabalho se propõe a examinar, sob abordagem técnica, os contornos legais da atuação de influenciadores digitais no Brasil, com especial atenção ao enquadramento jurídico da publicidade não identificada, à responsabilização objetiva no âmbito do Código de Defesa do Consumidor, à atuação dos órgãos de fiscalização e às medidas de mitigação de risco reputacional e sancionatório. A proposta é, portanto, fornecer uma análise ancorada nos marcos legais vigentes e nos desdobramentos práticos que derivam de sua inobservância, sem renunciar à aplicabilidade pragmática para agentes do mercado que buscam profissionalizar sua conduta comunicacional. 

2. Regime Jurídico Aplicável à Publicidade de Influenciadores 

A despeito da inexistência de regulamentação específica voltada à figura do influenciador digital, a sua atuação em campanhas de comunicação mercadológica encontra enquadramento normativo no arcabouço geral da publicidade e do consumo. O Código de Defesa do Consumidor estabelece os princípios da identificação ostensiva da publicidade e da vedação à comunicação enganosa ou abusiva. O influenciador que divulga produtos ou serviços, mediante contrapartida ou expectativa de benefício, sujeita-se às obrigações informacionais e de transparência próprias da comunicação publicitária. A ausência de sinalização explícita da natureza promocional do conteúdo configura, por jurisprudência consolidada, prática de publicidade enganosa por omissão. 

Paralelamente, a atuação do CONAR complementa o regime legal mediante diretrizes éticas obrigacionais. Tais documentos exigem que a publicidade seja “imediata e inequivocamente identificável”, recomendando expressamente o uso de marcações como “#publicidade”, “#parceriaPaga” ou “#anúncio” de forma destacada no início da publicação. Exemplo concreto: influenciadores foram objeto de medidas cautelares, advertências e recomendações de remoção de conteúdo em virtude da ausência de transparência quanto ao caráter comercial de suas postagens. Procons estaduais, o Ministério Público e a Senacon têm atuado em casos que envolvem propaganda de suplementos alimentares, produtos de saúde e investimentos financeiros, setores cuja regulação impõe deveres adicionais de advertência e licitude. 

O cenário normativo é dinâmico. Propostas legislativas indicam uma tendência de reforço à responsabilização de agentes comunicacionais, inclusive nas redes sociais. Influenciadores, portanto, devem interpretar sua atuação à luz do conjunto normativo vigente, sem negligenciar a expansão progressiva das obrigações que recaem sobre a publicidade digital. 

3. Jurisprudência Nacional e Responsabilidade Solidária 

Embora ainda em processo de consolidação, a jurisprudência brasileira tem avançado na delimitação da responsabilidade civil de influenciadores digitais, com ênfase na aplicação da teoria do risco do empreendimento e na presunção do dever de informação. Decisões recentes têm reconhecido a imputação de responsabilidade objetiva, especialmente em casos nos quais o influenciador recomenda ou divulga produtos com alegações não comprovadas ou omite a natureza publicitária da postagem. Uma influenciadora foi condenada ao pagamento de danos materiais e morais por divulgar suplemento alimentar com propriedades terapêuticas sem respaldo técnico, resultando em agravamento do quadro clínico de um consumidor. 

A fundamentação adotada considerou que a figura do influenciador configura elo relevante da cadeia de consumo, devendo responder solidariamente pelos efeitos da comunicação mercadológica que estimula a decisão de compra do seguidor. Tal entendimento vem se expandindo em casos que envolvem publicidade de produtos não regulamentados, investimentos de alto risco, apostas esportivas e até mesmo cursos digitais. Além das cortes estaduais, a atuação do CONAR também tem servido de substrato para decisões judiciais. A jurisprudência brasileira admite a responsabilização solidária entre influenciadores e patrocinadores, independentemente da comprovação de dolo, bastando a omissão do dever de diligência mínima sobre o conteúdo veiculado. 

4. Estratégia de Conformidade e Governança Pessoal 

A conformidade legal na atuação de influenciadores digitais transcende a mera observância normativa, configurando-se como um diferencial competitivo estratégico. A adoção de práticas transparentes e éticas na promoção de produtos e serviços não apenas mitiga riscos jurídicos, mas também fortalece a credibilidade e a reputação do influenciador perante seu público e parceiros comerciais. O cumprimento das diretrizes legais demonstra o compromisso do influenciador com padrões éticos elevados, valorizado por marcas que buscam parcerias sustentáveis. A conformidade legal também contribui para a redução da exposição a litígios e passivos regulatórios, proporcionando maior segurança jurídica. Influenciadores que adotam práticas de compliance robustas tendem a consolidar uma imagem pública de integridade e profissionalismo, o que impacta positivamente seu valor de mercado. 

A profissionalização da atuação dos influenciadores digitais requer a adoção de um conjunto sistemático de medidas jurídicas preventivas. Essas práticas formam a base de uma governança pessoal capaz de garantir segurança contratual, previsibilidade de riscos e aderência aos marcos normativos em vigor. Isso inclui a identificação inequívoca de qualquer conteúdo com caráter publicitário, a formalização contratual das relações comerciais, a diligência prévia sobre os produtos e serviços promovidos, a rastreabilidade das decisões editoriais e a capacitação jurídica contínua. 

5. Riscos Jurídicos e Efeitos Reputacionais 

A veiculação de conteúdo publicitário por influenciadores digitais sem a devida conformidade legal representa não apenas um risco jurídico relevante, mas também uma ameaça direta à continuidade e valorização de sua imagem profissional. A ausência de identificação explícita da natureza promocional do conteúdo — seja em razão da omissão de hashtags específicas, da falta de transparência verbal em vídeos, ou da dissimulação da relação contratual com a marca — pode configurar infrações administrativas perante os órgãos de defesa do consumidor. Além das consequências administrativas, a violação dos deveres de informação e transparência pode ensejar responsabilização civil. Consumidores prejudicados por publicações enganosas, seja por confiarem em promessas infundadas ou por adquirirem produtos de eficácia não comprovada, têm legitimidade para pleitear reparações. 

No campo da autorregulação, a atuação do CONAR tem repercussão significativa. A reprovação pública por conduta publicitária inadequada compromete a reputação do influenciador e, muitas vezes, inviabiliza parcerias com marcas de maior rigor institucional. No plano penal, condutas reiteradas de promoção comercial enganosa podem ser enquadradas como infrações tipificadas, com pena de detenção e multa. A erosão da confiança do público, ainda que de natureza imaterial, configura um dos impactos mais severos da publicidade irregular. A percepção de má-fé, deslealdade ou oportunismo compromete não apenas a audiência, mas o posicionamento de mercado e a atratividade contratual. 

6. Encaminhamentos e Conclusão 

A crescente profissionalização da atividade de influenciador digital impõe a necessidade de uma atuação pautada na conformidade legal e na responsabilidade ética. A ausência de regulamentação específica não exime esses profissionais do cumprimento das normas gerais aplicáveis, especialmente aquelas previstas no Código de Defesa do Consumidor e nas diretrizes do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. 

É imperativo que os influenciadores adotem práticas transparentes na divulgação de conteúdos patrocinados, assegurando que o caráter publicitário das postagens seja claramente identificado. A omissão dessa informação pode ser interpretada como publicidade enganosa, sujeitando o influenciador a sanções administrativas e judiciais. 

Além disso, a formalização de contratos com as marcas parceiras é essencial para delimitar responsabilidades e obrigações, prevenindo litígios e garantindo a segurança jurídica das relações comerciais. A diligência prévia sobre os produtos e serviços promovidos é outra medida crucial. O influenciador deve verificar a regularidade do produto junto aos órgãos competentes e assegurar-se de que as informações fornecidas são verídicas e não induzem o consumidor ao erro. 

Por fim, a capacitação contínua em temas jurídicos relevantes é recomendada. O influenciador deve manter-se atualizado sobre as normas que regem sua atividade, participando de cursos e consultando profissionais especializados. Essa postura proativa contribui para a construção de uma carreira sólida e alinhada às exigências legais e éticas do mercado. 

Avatar Arthur Vargas

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Arthur Vargas


Assistente Jurídico

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